O Blog do Coiso

Inexplicável. Uma boa palavra para caracterizar os exercícios de MACS (Matemática Aplicada a Carolas Suicidas).

terça-feira, janeiro 30, 2007

Che Guevara

Contra ti se ergueu a prudência dos inteligentes e o arrojo dos patetas
A indecisão dos complicados e o primarismo
Daqueles que confundem revolução com desforra
De poster em poster a tua imagem paira na sociedade de consumo
Como o Cristo em sangue paira no alheamentoordenado das igrejas

Porém
Em frente do teu rosto
Medita o adolescente à noite no seu quarto
Quando procura emergir de um mundo que apodrece.


Lisboa, 1972
Sophia de Mello Breyner Andresen
]Às vezes sinto-me assim, com vontade de emergir deste mundo.[

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sexta-feira, janeiro 05, 2007

Melhores dias virão

Devo ter sentido a água molhar-me a almofada
Devo ter ouvido os segundos no relógio de pulso um milhão de vezes
Devo ter-te ouvido a sussurrar algo.
Talvez estivesses a dizer-me o que eu queria ouvir.
Talvez estivesses a dizer-me que me amavas.
Mas a tua voz soou-me tão longínqua que não conseguia entender.
Devo ter olhado para os retratos que me gritavam "Fé, fé!" - tão felizes que fomos outrora...
Devo ter gritado para os retratos "Não sorrias, sua falsa!", e eles estremeceram e não sorriram, até que subitamente...
Devo ter visto os retratos e as molduras e as pessoas com caras felizes e mais o seu maldito bibe aos quadrados estatilharem-se no chão.
Devo ter semicerrado os olhos quando a luz se acendeu e eu me virei e tive vontade de dizer-te "Sinto a tua falta", e sinto a falta de quando me abraçavas e me consolavas, e de como adormecia no teu abraço, e de quando cantavas para mim ou me sorrias, e de quando me dizias que eu era o teu tesouro e de quando os teus olhos brilhavam de orgulho por eu ser tão talentosa, mas não consegui, porque tu simplesmente voltaste a mostrar-me que nos retratos éramos nós mas não éramos felizes, ou talvez fôssemos, e eu gostaria que sim, se gostaria, mas sinceramente não me lembro e devo ter ficado a olhar para ti como se fosses uma pessoa má.
E devo ter lamentado a minha existência, que estragou a tua porque sou e serei sempre tão sentimental, tão invariavelmente independente, tão pouco submissa, tão senhora-do-meu-nariz, tão dona de mim, tão envergonhada do que sou e do que te faço.
Mas gostava da privacidade que me tiraram e à qual sinto que não dás valor.
E depois devo ter-me mordido de nojo e raiva.


"Este é meu meu, com todo o seu ódio e toda a sua verdade."

Foi mais um dia.
]Ultrapassaremos.[

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